A denúncia espontânea é um instituto de direito tributário cujo escopo é incentivar o contribuinte que infringiu a lei a regularizar sua situação antes do conhecimento da infração pelo fisco.
Este instituto está previsto no Código Tributário Nacional, artigo 138, que assim determina:
Art. 138. A responsabilidade é excluída pela denúncia espontânea da infração, acompanhada, se for o caso, do pagamento do tributo devido e dos juros de mora, ou do depósito da importância arbitrada pela autoridade administrativa, quando o montante do tributo dependa de apuração.
Parágrafo único. Não se considera espontânea a denúncia apresentada após o início de qualquer procedimento administrativo ou medida de fiscalização, relacionados com a infração.
Antes de se analisar a norma que emerge do dispositivo, cumpre esclarecer que o Código Tributário Nacional, apesar de originalmente ser uma lei ordinária, foi recepcionado pela atual Constituição Federal com status de lei complementar, nos termos do artigo 146, III, “c”, da Constituição Federal. Este entendimento é pacífico nos Tribunais, de forma que nenhuma disposição contrária ao artigo 138 do C TN, seja emanada de lei federal, estadual, distrital ou municipal se aplica quando tratar de multa em denúncia espontânea.
Na prática, a aplicação do artigo 138 do Código Tributário Nacional traz como consequencia o contribuinte poder pagar tributo em atraso sem multa e restituir valores de multas pagos nos últimos cinco anos, desde que configurada a denúncia espontânea.
Para a análise da norma jurídica que emerge do artigo 138 do Código Tributário Nacional, devemos, primeiramente, firmar algumas premissas:
1ª) caracterização da denúncia espontânea: a denúncia espontânea ocorre quando o contribuinte cumpre a obrigação tributária antes de qualquer procedimento de fiscalização ou antes de informar o valor devido do tributo.
2ª) a exclusão da responsabilidade se refere à multa, tenha ela a denominação que for: punitiva, moratória, etc, decorrente do inadimplemento da obrigação tributária
Particularmente entendemos que a denúncia espontânea se aplica para a obrigação tributária principal (pagamento do tributo) e para a obrigação tributária acessória (por exemplo, entrega de declaração em atraso).
Aliás, o enunciado do caput do artigo é: a responsabilidade é excluída pela denúncia espontânea da infração, acompanhada, se for o caso, do pagamento do tributo devido e dos juros de mora. Este dispositivo dá margem para duas interpretações, pois somente há dois casos em que o pagamento do tributo não é devido: (i) obrigação tributária acessória, e (ii) parcelamento do débito.
Interpretando o artigo 138 do CTN, a Jurisprudência ora aplicava o instituto da denúncia espontânea para obrigações acessórias ora para excluir multas dos parcelamentos requeridos espontaneamente pelo contribuinte.
Após firmar o entendimento no sentido que a multa é devida no parcelamento espontaneamente requerido pelo contribuinte, o legislador igualmente interpretou a norma ao publicar a Lei Complementar 104/2001, determinando que o parcelamento será concedido na forma e condição estabelecidas em lei específica, vale dizer, que incide multa nos parcelamentos espontaneamente requeridos pelo contribuinte. Normalmente nestes casos as multas são reduzidas.
Assim, entendemos que a melhor interpretação do artigo 138 do Código Tributário Nacional, especialmente agora, é que se aplica para infrações tributárias decorrentes do descumprimento de obrigações tributárias acessórias. Este não é o posicionamento atual do Superior Tribunal de Justiça sobre o assunto, todavia, a tendência é isso mudar pois não se pode deixar de aplicar o CTN para este caso já que pacificou o entendimento que não se aplica nos parcelamentos. A lei não contém palavras inúteis, de forma que a única maneira de se dar aplicação ao artigo 138, na parte que dispõe a responsabilidade é excluída pela denúncia espontânea da infração, acompanhada, se for o caso, do pagamento do tributo devido e dos juros de mora, é retirar multas para denúncia espontânea de obrigação tributária acessória, mas este posicionamento é novidade, sendo que encontramos apenas um julgado recente do Tribunal Regional Federal da 4ª Região neste sentido.
Do ponto de vista prático – e esta é a função do presente – apresentamos as possibilidades jurídicas de aplicação do artigo 138 do Código Tributário Nacional para diminuir despesas e aumentar receitas:
Primeira possibilidade: tributo devido, não declarado em GFIP, DCTF, GIA, ou outro instrumento de informação ao fisco e pago espontaneamente (antes do início de qualquer fiscalização).
Um exemplo que podemos citar é o caso de um contribuinte que se dá conta que esqueceu de contabilizar faturamento – e i sso independentemente de pagar o imposto de renda pelo lucro presumido ou real. Imediatamente, antes de ratificar a DCTF, emite o DARF e paga o valor faltante. Sobre este valor não pode incidir multa, ou seja: pagará COFINS sem multa, PIS sem multa, CSSL sem multa e IRPJ sem multa.
Outro exemplo que podemos citar é o contribuinte que emprega mão-de-obra e se dá conta que deixou de entregar GFIP e pagar a GPS respectiva e, antes de enviar a GFIP retificadora, emite a guia e paga o valor faltante. Sobre este valor não pode incidir multa, ou seja: pagará contribuição ao INSS sem multa.
Da mesma forma, podemos citar o contribuinte que se dá conta esqueceu de contabilizar faturamento de serviço no qual incide o ISS. Imediatamente, antes de ratificar a declaração de ISS, emite a guia e paga o valor faltante. Sobre este valor não pode incidir multa, ou seja: pagará o ISS sem multa.
Segunda possibilidade: o contribuinte se dá conta que esqueceu de entregar declaração obrigatória ao Fisco e a entrega fora do prazo, mas antes de qualquer fiscalização ou notificação. Neste caso entendemos que não pode ser cobrada multa.
Pragmaticamente, a utilização deste instituto pressupõe uma assessoria jurídico-tributária atuante, pois via de regra as legislações tributárias dos entes federativos prevêem a cobrança de multa mesmo havendo denúncia espontânea. Assim, o contribuinte deverá impetrar mandado de segurança preventivo para afastar a multa ou pagar os valores e ajuizar ação de restituição. No Estado do Rio Grande do Sul, para tributos estaduais, considerando a inadimplência dos precatórios, há necessidade de uma atuação pró-ativa para se pagar sem a multa.
Por fim, cumpre ressaltar que em inúmeros casos contribuintes pagam estas multas sem questionar e não raras vezes possuem créditos a restituir de valores elevadíssimos, cuja restituição prescreve a cada cinco anos, razão pela qual é importante do ponto de vista estratégico da empresa averiguar a existência de pagamentos em atraso com multa e encaminhar para o jurídico analisar a possibilidade de restituição das multas pagas.
Concluindo, entendemos que é possível pleitear a aplicação do artigo 138 do Código Tributário Nacional para os casos especificados acima, seja de forma preventiva, seja após o pagamento indevido, mediante restituição. Todavia, não há resposta padronizada para a aplicação deste instituto, de forma que se impõe o exame de cada caso concreto por advogado com conhecimento de causa a fim de evitar prejuízos com ações judiciais.
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