Brasil ajusta Lei Anticorrupção estabelecendo integridade corporativa como ponto central

A Lei 12846/13, denominada de “Lei Anticorrupção”, foi promulgada em 2013, com foco na definição da responsabilidade civil e administrativa de pessoas jurídicas em casos de corrupção contra a administração pública nacional ou estrangeira.

No entanto, foi necessário mais de um ano e uma série de escândalos de corrupção para que fosse levada a sério. No dia 18 de março de 2015, a presidente Dilma Roussef assinou o Decreto 8420/15, definindo as diretrizes para a aplicação da lei anticorrupção.

Ninguém pode negar que a promulgação de uma lei destinada a responsabilizar pessoas jurídicas por práticas de corrupção contra a administração pública foi motivo de comemoração. Além de atender as reivindicações apresentadas em manifestações populares recentes para ações contra esta praga tão profundamente enraizada na história do país, a lei também viabilizou a conformidade com os compromissos assumidos na OCDE (“Organisation for Economic Cooperation and Development”).

Seguindo o exemplo da FCPA (“Foreign Corrupt Practices Act”) dos EUA e normas de outros locais, as empresas brasileiras (incluindo subsidiárias de grupos internacionais) também podem ser penalizadas por práticas de corrupção que ocorram em outros países. Incluindo também um capítulo dedicado ao acordo de leniência, onde se prevê que empresas envolvidas em corrupção podem firmar acordos com a administração pública – comprometendo-se a cooperar com a investigação do delito e cessar a prática. Ao fazer isso, uma empresa pode ser isentada da lista de contraventores do governo e beneficiar-se com uma redução de até 2/3 da multa.

Os impactos financeiros diretos e indiretos das sanções desencadearam grandes incentivos para que as empresas entrassem em conformidade com a lei. Com isso, as autoridades administrativas podem divulgar o nome da empresa em uma lista denominada de Cadastro Nacional de Empresas Punidas – publicando eventuais condenações de empresas por práticas de corrupção – o que pode dissuadir clientes e parceiros de efetivarem negociações com a empresa, além de impedi-la de participar em processos de licitação pública. Uma empresa condenada ao abrigo da nova lei anticorrupção também pode ser condenada a uma multa de até 20% de sua receita bruta anual ou ainda 3 vezes o montante da vantagem financeira recebida ou idealizada pela empresa contraventora, o que for menor dos dois. Com base nesta nota, entrar em um acordo de leniência pode isentar a empresa da “lista negra” e beneficiá-la com uma redução de até 2/3 da multa.

O decreto também estabeleceu o conceito de um suposto “Programa de Integridade” a ser adotado pelas empresas. Ele é composto por uma série de mecanismos, procedimentos internos, auditorias e incentivos a denúncias a fim de detectar e corrigir desvios, fraudes, irregularidades e ilegalidades contra as administrações públicas nacionais ou internacionais Entre os itens listados como parte do Programa de Integridade estão:  (i) o compromisso de dirigentes e diretores de aplicar e monitorar procedimentos de conformidade; (ii) programas de integridade e códigos de ética a serem adotados por equipes e fornecedores; (iii) treinamentos periódicos e avaliações de riscos; (iv) adoção das melhores práticas de contabilidade e transparência em relatórios financeiros; (v) programas de denúncia com canais adequados para os relatos e medidas disciplinares para os contraventores; e (vi) diligencia prévia específica em incorporações e aquisições.

Vale ressaltar que, nos termos desta lei, as pessoas jurídicas estarão sujeitas a responsabilidade objetiva, o que significa que uma empresa pode ser responsabilizada por quaisquer práticas exercidas em seu benefício, até mesmo por parte de terceiros. A responsabilidade objetiva também pode incitar responsabilidade pelos atos de fornecedores ou antigos proprietários/gestores no caso de uma incorporação ou aquisição.

Com o programa de integridade em operação, será possível estabelecer uma sólida defesa caso um empresa esteja envolvida em uma investigação de corrupção, além de diminuir o montante de uma eventual multa se esta for considerada responsável – como prova de que sua efetiva existência estabelece um fator de redução. No entanto, acima de tudo, dada a extensão das medidas previstas no programa de integridade, a sua adoção poderia, de fato, impedir o envolvimento de empresas e o risco de serem consideradas culpadas de acusações de corrupção.

Em suma, os fundamentos regulamentares para integridade corporativa estão definidos. O Brasil agora tem um poderoso instrumento para combater a corrupção envolvendo funcionários públicos. As empresas e a comunidade empresarial têm, mais do que nunca, o desafio de institucionalizar uma cultura ética entre todos os seus representantes e partes interessadas, pois um “deslize” neste âmbito poderá sentenciar seus negócios ao fracasso.

Fonte: Última Instância