Os colaboradores e a ética empresarial

São cada vez maiores as cobranças de diferentes segmentos sociais por um comportamento ético de políticos, empresas, associações, instituições, agentes públicos e organizações não governamentais. Muitas organizações vêm buscando atender a essa demanda com Códigos de Conduta e Códigos de Ética, em que se definem suas obrigações e visões, bem como sua expectativa em relação aos stakeholders, particularmente os colaboradores, que vivem o dia-a-dia da empresa, mas também a fornecedores, clientes, parceiros e outros. Adicionalmente, em decorrência da Lei Anticorrupção (Lei 12.846) as organizações maiores estão implantando ou ampliando programas de compliance que envolvem sistemas de acompanhamento, supervisão e controle com o objetivo de detectar fraudes, desvios, etc.

Como fica o colaborador com essas normas e controles?

A adoção de um Código de Ética ou Código de Conduta é uma medida positiva para todos, desde que feita de forma adequada. Ele orienta o colaborador e outros grupos sobre a forma de atuar da empresa e informa quais são seus valores. E também define atitudes e iniciativas que a organização espera de seus diversos stakeholders, em especial dos colaboradores. A existência do Código passou a ser também atenuante no caso de infrações à Lei Anticorrupção. Infelizmente, muitos desses códigos são feitos sem ouvir os colaboradores, que os recebem prontos e são chamados a assinar um documento se comprometendo a observar suas determinações.

A experiência internacional mostra que melhores resultados são obtidos pelas empresas quando elas buscam criar uma cultura ética e não apenas implantam códigos. Esta criação de uma cultura ética não é algo que se faz num determinado momento, mas um processo contínuo, que envolve abertura, transparência, respeito, diálogo e constante troca de ideias. E que exige treinamento periódico, com apresentação de casos, discussão e avaliação de alternativas e procedimentos, sistemas de comunicação confidencial para dúvidas e suspeitas, com retorno, e outras iniciativas. Este é um papel que pode ser coordenado pela área de RH, mas não deve ser de sua exclusiva competência; é preciso a participação de outras áreas.

O total envolvimento da alta direção e seu exemplo são fundamentais para que a equipe de fato assuma o programa: ética empresarial é como água, corre de cima para baixo. Se isto não acontece, como pode o colaborador achar que ele precisa ter sempre uma atitude íntegra, quando vê na mídia a empresa implicada em propinas e subornos a políticos e autoridades governamentais? Esta forma de agir da direção gera baixa confiabilidade entre os funcionários que percebem, de imediato, a falta de sintonia entre o que se escreveu e o que se pratica.

E aí, como se comporta num caso desses o funcionário que recebe a oferta de propina para comprar de determinado fornecedor, ou estabelecer um desconto maior para um cliente? Estudos estatísticos mostram que cerca de 10% das pessoas sempre agem de modo ético, por convicção, outros 10% sempre que possível transgridem as normas, e os demais 80% decidem caso a caso. Se o exemplo antiético vem de cima, o natural para este grupo majoritário é segui-lo. Por isso a importância do comportamento correto da alta direção.

Como agir quando alguém oferece propina e o colaborador quer se manter íntegro? A resposta é simples: recusá-la e informar a seu superior.  E no caso da relação com clientes? O procedimento deve ser sempre correto, oferecendo a melhor solução pelo preço estabelecido, com os descontos aplicáveis se for o caso, e as indicações completas sobre usos e qualidades. Nos casos de serviços o fundamental é não se propor a realizar o que não domina.

O mais complicado no Brasil é a relação com órgãos e agentes governamentais, em que a propina passou a ser uma constante, seja na forma de dinheiro ou benefícios pessoais como viagens, estadias, presentes de alto valor, etc. Os códigos normalmente usam como referência o limite de US$ 100 como o valor máximo de presente que pode ser aceito – acima disso o ideal é criar um “banco de presentes” para sorteio ou encaminhamento a uma associação beneficente apoiada pela empresa.

O Brasil se caracteriza por uma flexibilidade ética generalizada, que vem desde os tempos do início da colonização, o que é um dificultador da cultura ética e das relações éticas. Isso só vai mudar se os dirigentes assumirem como uma de suas principais responsabilidades: impedir irregularidades, mesmo que isso resulte em perdas econômico-financeiras (ou políticas). E, se de fato, ocorrerem as punições previstas na lei para pessoas e empresas, o que parece estar começando a acontecer.

Fonte: Última Instância