Considerações jurídicas sobre o fenômeno WhatsApp

Hoje em dia é difícil encontrar alguém que tenha um smartphone e não utilize o WhatsApp Messenger. O aplicativo que envia mensagens de texto, fotos, vídeos e outros arquivos grátis pela internet é cada vez mais usado pelas pessoas para comunicação.

Sucesso consagrado com o anúncio em fevereiro deste ano pelo Facebook: a compra do aplicativo WhatsApp por US$ 16 bilhões. Foi o valor mais alto já pago por um aplicativo para smartphones desde que a rede social de Mark Zuckerberg comprou o Instagram;  também é a maior aquisição da companhia.

O maior ativo do WhatsApp é a facilitação na comunicação, propiciando a liberdade de manifestação do pensamento e, via de consequência, ainda que de forma indireta, a consagração da democracia. Como todo o tipo de facilitador que está à disposição dos indivíduos no formato eletrônico é exponencial a propagação de conteúdos, inclusive na modalidade de mensagens para grupo de pessoas.

Os negócios que prosperam estão, inevitavelmente, sujeitos `as complicações e os desafios que surgem, principalmente, os jurídicos.

Então, proponho um giro sobre os aspectos jurídicos que envolvem o WhatsApp.


Conteúdo de mensagens via WhatsApp

Conversas realizadas nos intitulados grupos “Atlética Chorume” e “Lixo Mackenzista” criados no WhatsApp, em maio de 2014, continham, supostamente, montagens pornográficas com fotos de uma estudante universitária paulista.

Em decisão, o juiz de primeiro grau determinou: “Deverão ser identificados os envolvidos e os IPIs de seus perfis na rede social.”

Contra tal decisão, o Facebook interpôs agravo vislumbrando o reconhecimento de sua ilegitimidade de parte sustentando a tese de impossibilidade de cumprir a determinação com relação à disponibilidade do teor de conversas realizadas por meio do aplicativo, uma vez que não possui gerência sobre ele. Sustentou ainda no âmbito de sua ilegitimidade que a transação de aquisição do WhatsApp ainda não foi concluída, razão pela qual ainda não possui representação no Brasil.

A 8.ª Câmara de Direito Privado do TJ-SP (Tribunal de Justiça de São Paulo) confirmou decisão de primeiro grau, com voto proferido pelo desembargador Salles Rossi no sentido de que o fato de o aplicativo não possuir representação em território nacional não impede o ajuizamento da medida contra o Facebook. “Some-se a isso que serviço do WhatsApp é amplamente difundido no Brasil e, uma vez adquirido pelo Facebook e somente este possuindo representação no país, deve guardar e manter os registros respectivos, propiciando meios para identificação dos usuários e teor de conversas ali inseridas determinação, aliás, que encontra amparo na regra do artigo 13 da lei 12.965/14 (conhecida como Marco Civil da Internet).”


Propaganda Eleitoral via WhatsApp

O Ministério Público Eleitoral ajuizou, semana passada, representação contra o deputado Federal e candidato a governador Anthony Garotinho (PR) e os sócios da Aplicanet Informática pelo envio de mensagens no celular de eleitores (SMS e Whatsapp). O MP Eleitoral pede que o TRE-RJ (Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro) proíba o envio de mais mensagens com fins eleitorais e aplique para cada réu a multa máxima nesses casos, de R$ 30 mil, de acordo com a lei 9.504/97. Na ação, o procurador justifica o pedido da punição elevada pelo alcance significativo do meio usado e pela reiteração da conduta, mesmo após uma proibição determinada pela 209.º Zona Eleitoral em julho.

E segue o procurador em sua representação: “Diante de tamanha invasão da privacidade alheia, a ponto de causar reações de revolta, como se extrai dos autos, entre muitos eleitores, ‘obrigados’ a suportar, quase que diariamente, mensagens que consideram indesejáveis, que não lhes dizem respeito ou cujo envio sequer por eles anuído.”

Novamente temos o debate em torno da privacidade.

Este tema é de relevância suprema pela possibilidade de atingir a todos nós. Repito aqui algumas frases que já imprimi nesta coluna, no artigo: Eu posso ser esquecido? : O confronto entre liberdade de informação e os direitos da personalidade, onde ambos transitam pelos domínios do direito constitucional, em que de um lado há o legítimo interesse de “querer ocultar-se” e, de outro, o não menos legítimo interesse de se “fazer revelar”, a questão poderá ser solucionada a partir da exegese dos arts. 11, 12, 17, 20 e 21, do Código Civil, todos em acordo com a Constituição Federal.

Há que se julgar caso a caso para decisão de qual principio constitucional deverá prevalecer.

E também utilizando o WhatsApp estão os candidatos em Minas Gerais, Pimenta da Veiga (PSDB) e Fernando Pimentel (PT). São várias acusações que trocam acusações em vídeos compartilhados.


Grupo no WhatsApp  formado por empregados

Demissão de uma subgerente por justa causa foi revertida pela Justiça do Trabalho. Trata-se de dispensa sob a alegação de que mantinha um grupo com a equipe de colegas de trabalho no aplicativo WhatsApp. Em tal grupo criado no aplicativo, segundo a empresa, eram mantidas mensagens nas quais eram atribuídos apelidos pejorativos a outra empregada e ao diretor executivo. A empregada alegou ter criado o grupo para facilitar a comunicação com a equipe, mas que não controlava as conversas.

O entendimento da magistrada da 2.ª Vara do Trabalho de Taguatinga/DF foi no sentido de que não haveria provas de que a conduta da funcionária tenha lesado a honra e a boa fama da empresa: “Os trechos extraídos das mensagens e transcritos na peça defensiva, ao contrário do que pretendia demonstrar a reclamada, não indica que a reclamante tenha realizado qualquer manifestação pejorativa a algum empregado ou preposto da empresa. Dessa forma, observa-se que as reclamadas não conseguiram comprovar a veracidade dos motivos que levaram a dispensa por justa causa da reclamante, tendo, inclusive, as testemunhas apresentadas por ambas as partes confirmado a inexistência de comentários realizados pela reclamante sobre seus superiores hierárquicos.”

Também aqui estamos diante da dicotomia entre a liberdade de manifestação do pensamento e a inviolabilidade da vida privada. Continua a juíza em sua sentença prolatada: “O celular é um aparelho eletrônico de uso particular do indivíduo, ou seja, um instrumento de troca de informações de âmbito privado.” E prossegue: “A reclamante, enquanto gerente da empresa, não tinha direito ou obrigação de censurar o teor das conversas havidas dentro do grupo pelo celular, dado o próprio caráter privado da troca de informações em questão e do direito à livre manifestação de pensamento assegurado também pela Carta Constitucional.”

Fonte: Última Instância